Naquele dia o dia estava por mim, abriu-se a luz do meu olhar. Disparei, cruzei as luzes, as perspectivas, os tons e as formas e as paredes apareciam pintadas.
Os dias são como as pessoas, não são sempre iguais, têm jeitos e trejeitos, implodem e explodem, sorriem e inspiram, conspiram, e nós andamos neles sujeitos aos seus estados, não somos nós os comandantes.
Não é um quadro mas uma parede forrada a pladur. Está inacabada. Deve ficar branca para receber quadros. Talvez possa dizer outros quadros, pois fora da tela há paredes que pintam.
"...Ligo mais à legitimidade do que à legalidade. Quando a legalidade vai contra o que eu acho que é legítimo, se puder transgrido. Se não puder, também. Sendo politicamente conservador em muita coisa, não sou nada ordeiro. Sou bastante subversivo em relação a muita coisa..."
Cruza o laranja, o verde, passa o branco, o preto, segue um sorriso e também a tristeza, olhos nos olhos, olhos no vazio, olhos no caminho, passo ao largo, passo mais passo, com passo miúdo, todos num compasso e eu ali, parado e sem passo, olho ao longe o futuro.
Regressei à cidade. Despedi-me daquele eu que me queria longe de mim e demiti a revolta do tempo passado. Não houve gritos, não houve choros, não houve sequer uma festa. Talvez porque nunca tenha de facto partido.
A pé e de coração leve Eu enveredo pela estrada aberta, Saudável, livre, o mundo á minha frente, À minha frente o longo atalho pardo levando-me aonde eu queira. Daqui em diante não peço mais boa-sorte, Boa-sorte sou eu. Daqui em diante não lamento mais, Não transfiro, não careço de nada; Nada de queixas atrás das portas, De bibliotecas, de tristonhas críticas; Forte e contente vou eu Pela estrada aberta. A terra é quanto basta: Eu não quero as constelações mais perto Nem um pouquinho, sei que se acham muito bem Onde se acham, sei que são suficientes Para os que estão em relação com elas. (Carrego ainda aqui Os meus antigos fardos de delícias, Carrego – mulheres e homens – Carrego-os comigo por onde eu vou, Confesso que é impossível para mim Ficar sem eles: deles estou recheado E em troca eu os recheio.)
Para a Rita, a principal responsável do meu acreditar na vida e no amor.
“… Sabemos poucas coisas, mas a certeza de que devemos sempre preferir o difícil não nos deve nunca abandonar. É bom estar só, porque a solidão é difícil. Se uma coisa é difícil, razão mais forte para a desejar. Amar também é bom porque o amor é difícil. O amor de um ser humano por outro é talvez a experiência mais difícil para cada um de nós, o mais alto testemunho de nós próprios, a obra suprema em face da qual todas as outras são apenas preparações. É por isso que os seres muito novos, novos em tudo, não sabem amar e precisam de aprender…”